sábado, 11 de julio de 2009

Directo de Ramallah, Palestina


Directo de Ramallah, Palestina
Israel nega o direito dos palestinos a um Estado, tem um ministro do exterior que os deseja a expulsar de Israel – a solução da questão palestina tem que apontar para Telaviv e não para os palestinos.
Emir Sader Para Kaos en la Red 10-7-2009 107 lecturas
www.kaosenlared.net/noticia/directo-de-ramallah-palestina


-->1. A RESISTÊNCIA CULTURAL
Uma ocupação colonial não é apenas uma ocupação militar. Ela precisa tentar impedir a sobrevivência da cultura, da memória do povo ocupado. Mais ainda se se trata da ocupação de um povo com uma das mais antigas histórias e mais ricas culturas.
Como era impossível que a Capital da Cultura Árabe pudesse ser Bagdade, pela ocupação das tropas norte-americanas, foi decidido que Jerusalém (que eles chamam de Al-Quds) fosse a Capital da Cultura Árabe de 2009. As comemorações têm sido vítimas das mais violentas e odiosas repressões das tropas israelenses de ocupação. Organizar lindas actividades em torno da cultura árabe, que deveriam realizar-se nas ruas e praças de Jerusalém, passou a ser um imenso desafio para o Comité Palestino de Organização, por dificuldades de recursos, de convidar pessoas – poetas, músicos, cantores, artistas do mundo árabe e de outras regiões do mundo – para vir a uma região cercada e ocupada.
O acto de apresentação do logotipo dos eventos, programada para se dar no Teatro Nacional de Jerusalém, em Abril do ano passado, foi proibido por Israel, declarado ilegal e reprimido brutalmente por forças militares para tentar impedir a sua realização. Foram presos três dos membros do grupo organizador.
Apesar de todas as dificuldades, deu-se início às comemorações no dia 21 de Março deste ano, com actividades populares nas ruas de Jerusalém, que terminaram com uma noite de gala em Bethlehem. Israel enviou tropas contra crianças que carregavam balões com as cores da bandeira palestina – vermelhas, brancas, verdes e pretas. As tropas de ocupação atacaram os jovens que iam realizar danças tradicionais palestinas, com as suas roupas típicas, produzindo cenas de pânico e desespero.
Como reacção, todas as escolas, universidades, centros culturais, prefeituras de dentro ou de fora da Palestina, decidiram assumir a celebração organizando actividades sobre a bandeira e o logotipo de Jerusalém Capital da Cultura Árabe de 2009. Centenas de eventos aconteceram em muitos países como mostra de solidariedade e de protesto contra a repressão israelense. Fica claro, cada vez mais, que não se trata da ocupação e da acção militar contra “forças terroristas”, como alegam os ocupantes, mas contra a resistência da cultura palestina.
Os palestinos adoptaram o lema: “Jerusalém une-nos e não deve dividir-nos”, reforçando a necessidade de união de todos os palestinos para derrotar a ocupação e pela conquista do direito de um Estado palestino, reconhecido pelas Nações Unidas, mas impedida pelos EUA e por Israel.
«Uma vez libertada, Jerusalém não será apenas a inquestionável capital da cultura árabe, mas será a cidade da diversidade cultural e religiosa, da tolerância e do respeito pelos outros. Uma cidade aberta para a paz cujos tesouros históricos e religiosos serão desfrutados por todos, do leste e do oeste. O único muro que a cercará será o muro histórico da sua Cidade Velha e suas 12 portas, incluindo a Porta de Ouro que, uma vez aberta, levará todos os povos do bem para o céu.»
As palavras são de Ragiq Husseini, presidente do Conselho Administrativo do Comité Nacional pela Celebração de Jerusalém como Capital da Cultura Árabe em 2009. Estar aqui, chegar a Ramallah revela, com toda a força, como este é um território ocupado, cruzado por muros que dividem os próprios palestinos, povoado de tropas e de carros militares, submetendo este heróico povo à ocupação, à opressão, à humilhação, na mais grave situação de violação dos direitos humanos – políticos, sociais, económicos, culturais – no mundo de hoje.
2. OCUPAÇÃO, COLONIALISMO E APARTHEID
Uma coisa é ouvir falar, ler, falar de ocupação. Outra é ver o que significa. Ramallah, uma cidade pacífica, sem violência, sem problemas de segurança, onde se pode andar por qualquer bairro a qualquer hora do dia ou da noite, uma cidade sem população de rua, sem crianças abandonadas.
A ocupação israelense significa a brutalidade de cortar a cidade com muros, que separam palestinos de palestinos. Há uma grande avenida que o muro corta de um lado ao outro da rua. Os muros separam, segregam, colocam entre palestinos e palestinos os controles, comandados por soldados israelenses armados até aos dentes, que exercem sistematicamente o seu poder armado, com arbitrariedade e discriminação. Não há lógica nos muros, é um exercício conscientemente arbitrário, para demonstrar – como faz o torturador diante da sua vitima – que o ocupante pode fazer o que bem entender, sem qualquer lógica, só como exercício do poder armado de que dispõe.
Muros para lacerar na carne o orgulho, a auto-estima, para tentar desmoralizar os palestinos, levá-los ao dilema entre a passividade, a resignação, ou o desespero das acções armadas. Esta seria a atitude espontânea de qualquer ser humano, diante das humilhações a que são submetidos os palestinos, diante da demonstração brutal de força. Parece que os ocupantes querem provocar reacções violentas, que justificariam novas ofensivas violentas.
Os palestinos gastam várias horas por dia nas filas dos controles. Para ir de Ramallah a Jerusalém pode-se tomar 10 minutos ou três horas, na dependência do arbítrio das tropas de ocupação. Os palestinos têm que elaborar guias de sobrevivência para sobreviver com os 630 pontos de controle na Palestina actualmente.
Trata-se de uma ocupação ilegal, injusta, de discriminação racial, do tipo do apartheid sul-africano. Os israelenses querem impedir os palestinos de ter um Estado como foi reconhecido a Israel no fim da Segunda Guerra Mundial. Julgar-se um “povo escolhido” – também isto eles têm em comum com os norte-americanos. Como disse Edward Said, os palestinos são as «as vítimas das vítimas». Os israelenses consideram-se vitimas, mas passaram a ser verdugos, colonialistas, imperialistas, racistas.
Ver os muros, a sua violência, a sua brutalidade, a frieza da sua desumanidade, diante das casas humildes, das oliveiras – tantas casas e oliveiras destruídas para a construção dos muros – dos palestinos, permite sentir no mais profundo de cada um os dois mundos que se contrapõe aqui. A neutralidade, a passividade, tornam-se impossíveis, cúmplices, diante de tanta injustiça e violência.
Um Estado terrorista, um Exército do terror, tropas de ocupação coloniais, acções imperiais – essa a ocupação israelense do que deveria ser território palestino. Do que deverá ser território de uma Palestina livre, democrática e soberana.
3. POR QUE ISRAEL NÃO ACEITA UM ESTADO PALESTINO
Israel e EUA vão em direcções opostas? Enquanto Obama tenta resgatar uma imagem internacional muito desgastada, de que faz parte a retomada de negociações sobre a Palestina, Netanyahu vai na direcção oposta. Enquanto o seu partido não reconhece, nem formalmente, o direito ao Estado palestino, pressionado por Obama, apresentou uma impossível proposta, mais uma armadilha do que algo que apontasse para a retomada de negociações com os palestinos.
Para quem constata, aqui, na Palestina, a ocupação militar, os muros, os assentamentos, protegidos militarmente, é ridícula a proposta do primeiro ministro de Israel de um Estado Palestino desmilitarizado. Porque trazer a paz à Palestina é, antes de tudo, a retirada imediata e incondicional das tropas israelenses de ocupação dos territórios palestinos. Isso é desmilitarizar.
Por outro lado, não apenas não desmontar, como continuar a instalar assentamentos judeus no coração da Palestina – não apenas no campo, mas no centro de cidades como Ramallah –, é sabotar concretamente qualquer solução política pacífica para a questão palestina. Dizer que deseja negociações com a Palestina, mas ao mesmo tempo afirmar e continuar a instalar assentamentos, é dizer, pela via dos factos, que Israel quer perpetuar a ocupação genocida dos territórios palestinos.
Israel nega à Palestina o mesmo direito que ele tem: o de ter um Estado soberano, apesar das decisões reiteradas da ONU, que garantem a existência de dois Estados, um israelense, o outro palestino, com os mesmos direitos. Com territórios contínuos, com soberania, com direito de regresso dos imigrantes. Por que Israel não aceita a existência de um Estado Palestino? Por que Israel passou de vítima a verdugo?
O argumento usual era o de que os palestinos eram uma ameaça para a sobrevivência de Israel. Mas desde que a Autoridade Palestina, através de Arafat, passou a reconhecer o direito à existência do Estado de Israel, esse argumento desapareceu. Alega Israel que os palestinos são “terroristas”, mas todas as reacções à ocupação militar, às agressões quotidianas e as humilhações quotidianas contra os palestinos, em seus próprios territórios, configuram, claramente, um regime de terror contra o povo palestino.
Nestes dias aqui, na Palestina, pudemos constatar a queima de plantações de trigo dos palestinos, feitas por colonos judeus dos assentamentos. A aprovação de mais 250 milhões de dólares por parte do governo israelense, para continuar os assentamentos. Casas palestinas continuam a ser derrubadas, para a construção de novos assentamentos. A expulsão arbitrária de palestinos de Jerusalém, a derrubada de casas e oliveiras, o assédio constante, para incitar ao abandono da cidade santa.
Mas, além disso, ao inviabilizar – pelo cerco militar, pela ocupação, pelas incursões genocidas das suas tropas, por ataques genocidas, como o realizado recentemente contra Gaza – o desenvolvimento económico, Israel estabelece uma situação de super-exploração dos palestinos. Incita os palestinos ou a emigrar para outros países ou a submeter-se a ser superexplorados pelos israelenses. Os absurdos muros tem menos uma lógica de defesa militar e muito mais de inviabilização económica da Palestina.
Além de que a ocupação militar serve também para a apropriação dos recursos naturais da Palestina. Como exemplo, Israel utiliza 6 vezes mais água do que os palestinos, embora explore os mananciais situados na Palestina.
Mas o objectivo maior da ocupação é a tentativa de assassinar a identidade do povo palestino, de liquidar a sua memória histórica, de liquidar a auto-estima dos palestinos, de desmoralizá-los, de dispersá-los pelo mundo afora, fomentando a diáspora e bloqueando o retorno dos palestinos aos seus territórios.
Se Obama quer, de facto, pressionar Israel para que reabra negociações reais, o primeiro que deveria fazer seria não mais exercer o direito de veto na ONU em todas as resoluções de condenação de Israel. Além de ameaçar e verdadeiramente suspender o imenso apoio militar que o seu país dá a Israel para que o país ocupe os territórios dos palestinos.
Quando Israel possui um governo que nega o direito dos palestinos disporem de um Estado, aprovado pelas Nações Unidas, possui um ministro de relações exteriores que deseja a expulsão dos palestinos de Israel, até mesmo o ataque nuclear para destruir os palestinos – fica claro que a solução política da questão palestina tem que apontar para Telaviv e não para os palestinos.

António Barata en Kaos en la Red

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